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TJ mantém Salomé afastado em Araputanga e bloqueio de R$ 2 milhões


Por Folha Max

TJ mantém Salomé afastado em Araputanga e bloqueio de R$ 2 milhões

Foto: Divulgação

Gestor de Araputanga é suspeito de fraudar licitações em conluio com secretários

O desembargador Luiz Carlos da Costa rejeitou agravo de instrumento para determinar o retorno as funções do prefeito de Araputanga, Sidney Salomé (PMDB), afastado desde agosto por ordem judicial pelo prazo de 180 dias por conta da suspeita de envolvimento em fraude em licitação, configurando assim em improbidade administrativa. O magistrado também manteve o bloqueio de bens de R$ 2 milhões do peemedebista.

Também seguem afastados das funções públicas os ex-secretários das pastas de Administração e Finanças, Etelmínio de Arruda Salomé Neto, irmão do prefeito, e Edonias Alves da Costa. Todos são suspeitos de comandar um esquema de fraude em licitação por meio do uso de empresa de fachada, junto com o sócio da empresa Meta Assessoria e Consultoria Contábil LTDA, Elias Rodrigues de Oliveira. 

De acordo com a ação proposta pelo promotor de Justiça, Luiz Fernando Rossi Pipino, o desvio ocorreu nos anos de 2013, 2014 e 2015, na ordem de R$ 608.017,42 mil. O valor da indisponibilidade de bens chega a R$ 1.824.052,36 milhão, por conta da multa civil.

No ano de 2013 a empresa venceu duas licitações e, assim, celebrou contratos com o Município para a realização de serviços de contabilidade, consultoria em gestão empresarial, contábil e tributária, e também para implementação e manutenção de sistema de georreferenciamento. Conforme as investigações, ficou demonstrado que Edonias Alves da Costa, que era um dos sócios da empresa, foi nomeado pelo prefeito para ocupar o cargo de secretário de finanças em janeiro de 2013. 

No mês seguinte, o até então secretário municipal cedeu e transferiu a totalidade de suas quotas a outros sócios ingressantes, dentre eles Elias Rodrigues de Oliveira. Pouco mais de dois meses depois, os procedimentos licitatórios foram abertos, tendo se sagrado vencedora a empresa que o até então secretário era ex sócio, cujos certames foram concluídos em apenas três semanas. 

Para garantir o desvio de dinheiro, o prefeito municipal nomeou para fiscalizarem os contratos justamente os ex secretários. O chefe do Executivo Municipal ainda nomeou o ex secretário de finanças para a presidência da Comissão Permanente de Licitação. 

Além disso, constatou-se que o prefeito municipal havia empenhado determinada quantia de valor em favor da empresa antes mesmo da abertura das licitações, cujo comportamento demonstra que a pessoa jurídica contratada já estava previamente escolhida pelo administrador público. O município realizava a transferência de valores para a conta bancária da empresa, sob o pretexto de pagamento dos serviços de consultoria, sendo que parte desse numerário retornava diretamente da conta da pessoa jurídica para as contas bancárias de titularidade dos ex secretários. 

Ao manter o afastamento do prefeito e de seus secretários, o desembargador Luiz Carlos da Costa entendeu que não se pode desconsiderar que a continuidade do prefeito no cargo poderia corromper e “acertar” documentos, forjar provas, intimidar servidores públicos subordinados, com o fito de intuito de afastar eventual responsabilidade. Além disso, reforçou que existem indícios suficientes de atos de improbidade administrativa.

 

ÍNTEGRA DA DECISÃO

Recurso de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por Sidnei Pires Salomé, para reformar decisão que, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa c/c pedido liminar de indisponibilidade de bens e afastamento cautelar do Prefeito Municipal de Araputanga/MT proposta pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra si, Etelmínio de Arruda Salomé Neto, Edonias Alves da Costa, Elias Rodrigues de Oliveira e Meta Assessoria e Consultoria Contábil Ltda., deferiu a medida cautelar para o seu afastamento do cargo público de Prefeito do Município de Araputanga, pelo prazo de cento e oitenta (180) dias.

Assegura que não há razão que justifique o seu afastamento cautelar do cargo de Prefeito, tendo em vista que aos documentos que serviram de base para a propositura da ação foi conferida a devida publicidade, inclusive, com o seu envio ao Tribunal de Contas do Estado. Logo, trata-se de informações de domínio público, cujo acesso é garantido a qualquer cidadão, de forma que a sua permanência no cargo não trará qualquer prejuízo à instrução processual.

Assevera que o depoimento de Gaspar Barbosa de Melo, a relatar que na madrugada do dia 26 de julho de 2015, enquanto no exercício da função de vigia, presenciou movimentação suspeita na sede da Prefeitura de Araputanga, não é suficiente para embasar a medida extrema, uma vez que se trata de mera presunção.

Afiança que o comportamento institucional do agravante pode ser comprovado pelas informações extraídas dos Processos nº 76449/2014 e nº 7.502-7/2013, que tratam das contas anuais de governo e de gestão referente ao exercício de 2013, aprovadas pelo Tribunal de Contas.

Acentua que o afastamento do cargo, sem que antes lhe fosse oportunizado manifestar nos autos, violou seu direito ao contraditório e à ampla defesa, bem como ao devido processo legal, além de malferir os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, visto que a medida restou determinada em detrimento de outras legalmente previstas que poderiam perfeitamente atender ao interesse público, sem violar o mandato eletivo a ele outorgado pela comunidade.

Afirma, ademais, que a alternância de Poder importa em abalo à Administração Pública e, em especial, à população, visto que causa insegurança administrativa e jurídica, circunstância a reforçar e necessidade de reforma da decisão.

É a síntese.

Eis o teor do dispositivo da decisão:

[...] 96. Ante o exposto, presentes os pressupostos fundamentadores da liminar (fumus boni juris e periculum in mora), e com fundamento nos artigos 461 c/c 798 do Código de Processo Civil e artigo 7º da Lei 8.492/1992, defiro a liminar requerida para decretar:

I) a indisponibilidade dos bens dos requeridos Sidney Pires Salomé, Etelmínio de Arruda Salomé Neto, Edonias Alves da Costa, Elias Rodrigues de Oliveira, Meta Assessoria e Consultoria Contábil Ltda, até o montante apontado na exordial (R$ 608.017,42), acrescido da multa civil em dobro prevista no artigo 12, inciso II, da Lei n° 8.429/1992, totalizando a quantia de R$ 1.824.052,36 (um milhão, oitocentos e vinte e quatro mil e cinquenta e dois reais e trinta e seis centavos), e determino:

a) Expedição de ofício a Corregedoria-Geral de Justiça, para que informe aos Cartórios de Registro de Imóveis do Estado a imposição de medida, de modo a dar-lhe eficácia;

b) Expedição de ofício ao Departamento de Trânsito Estadual, para obstar a transferência do registro de veículo(s) que porventura esteja(m) em nome do acionado, por intermédio do Sistema RENAJUD

c) Expedição de ofício ao Banco Central, para que este noticie a decisão de indisponibilidade às agências bancárias no Estado de Mato Grosso, em face da existência de possíveis aplicações financeiras e/ou investimentos em nome do promovido, exceto se for possível efetivar o bloqueio imediato dos valores depositados em contas bancárias, em montante suficiente para a garantia do ressarcimento do dano ao erário público, independentemente de ofício, por intermédio do sistema BACENJUD;

d) Expedição de Ofício aos Cartório de Registros de Imóveis dos Município de Araputanga/MT, Cuiabá/MT e Jauru/MT para que certifique a existência de bens imóveis registrados em nome do demandado e anotem, assim, a sua indisponibilidade

e) Expedição de ofício a Delegacia da Receita Federal, requisitando-se o envio das declarações de bens e rendimentos do requerido dos últimos 05 (cinco) anos, por intermédio do Sistema INFOJUD.

f) Expedição de ofício a Prefeitura Municipal de Araputanga/MT e à Câmara de Vereadores de Araputanga/MT, para que forneçam as cópias de todas as declarações de bens do acionado a que faz alusão o art. 13, § 2º, da Lei Federal nº 8.429/1992.

II) o afastamento cautelar do Prefeito Municipal Sidney Pires Salomé de suas funções, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, com fundamento no artigo 20, parágrafo único, da Lei 8.429/1992, sem perda da remuneração mensal a que faz jus, a fim de resguardar a eficácia da instrução processual, e estando presentes os requisitos da cautelar, determinando ao seu substituto, o vice-prefeito, que o suceda, imediatamente, até ulterior deliberação ou esgotamento do prazo assinalado no presente decisum.

97. Com vistas ao cumprimento desta ordem, determino expedição de ofício ao Presidente da Câmara Municipal de Araputanga, para providências atinentes à substituição em referência; oficiando-se, também, os estabelecimentos bancários nos quais a municipalidade possua contas, para que, a partir desta decisão, não mais reconheçam a titularidade do gestor, ora afastado, para a movimentação das mesmas, tudo sob as penas da lei, em caso de desobediência (art. 330 do Código Penal).

98. Notifique-se o requerido para que ofereça manifestação por escrito, que poderá ser instruída com documentos e justificações, no prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do artigo 17, parágrafo 7° da Lei 8.429/1992.

99. Sem prejuízo, intime-se o Município de Araputanga para que, havendo interesse em integrar esta lide, se manifeste, nos termos do artigo 17, §3°, da Lei 8.429/1992.

100. Decreto o segredo de justiça nos autos. Anote-se.

101. Notifique-se o Ministério Público acerca do teor da decisão. [...]. (fls. 64/65).

Quanto ao afastamento do agravante do cargo de Prefeito do Município de Araputanga, anoto que o artigo 20, parágrafo único, da Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, autoriza o afastamento cautelar do agente público, em ação civil pública por improbidade administrativa, medida necessária à cessação da prática de atos ímprobos, com a garantia de que a instrução processual possa ter seu curso normal, sem a dolosa atuação do agente, que acabe por tornar inútil a providência que visa resguardar os princípios insculpidos na cabeça do artigo 37 da Lei Mais Alta.

Indícios da prática de gravíssimos atos de improbidade administrativa abundam e estão bem caracterizados na decisão, fundamentada a não mais poder.

[...] 49. Em análise perfunctória, verifica-se que a questão posta em sede de cognição não exauriente levanta fortes evidencias de que os procedimentos licitatórios (Pregão nº 17/2013 e Pregão nº 24/2013) foram deflagrados com o propósito de desviar dinheiro público, vejamos:

a)O então Secretário Municipal de Finanças e Planejamento, Edonias Alves da Costa, era sócio da empresa contratada pelo Município de Araputanga/MT (Meta Assessoria e Consultoria Contábil Ltda) até pouquíssimo tempo antes da abertura das licitações;

b)Decorreram apenas 03 (três) semanas entre os pedidos administrativos dos Secretários Municipais para a contratação de empresa da área de consultoria contábil e administrativa e a formalização dos respectivos contratos por parte do Prefeito Municipal de Araputanga/MT. Os procedimentos licitatórios foram deflagrados e concluídos às pressas.

c)O Prefeito Municipal de Araputanga/MT, Sidney Pires Salomé, nomeou para o exercício das necessárias atividades de fiscalização (fiscalizador dos contratos e presidente da Comissão Permanente de Licitação) justamente os até então Secretários Municipais de Finanças/Planejamento e Administração, Edonias Alves da Costa e Etelmínio de Arruda Salomé Neti;

d)O Prefeito Municipal de Araputanga/MT, Sidney Pires Salomé, empenhou determina quantia de valor em favor da empresa Meta Assessoria e Consultoria Contábil Ltda. antes mesmo da abertura do pertinente procedimento licitatório, uma vez que a licitação fora autorizada no dia 22.04.2013, cujo edital fora publicado no dia 23.04.2013. O Chefe do Poder Executivo Municipal, enquanto ordenador de despesas, empenhou o valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) em favor da empresa no dia 15.04.2013, ou seja, antes mesmo de ter sido aberta a licitação, como denota-se da análise dos documentos de fls. 437/438, o que demonstra, em tese, que a empresa já estava previamente escolhida.

e)Há fortes evidências de que a empresa Meta Assessoria e Consultoria Contábil Ltda. é uma “empresa de fachada”. Segundo os elementos informativos à sede empresarial (primeiramente indicada como sendo na residência da mãe de Edonias Alves da Costa, e depois como sendo na residência de Elias Rodrigues de Oliveira), a Relação anual de Informações Sociais (RAIS) comprova que a empresa não possuía sequer um único funcionário registrado em seu quadro no ano de 2013.

f)A Prefeitura Municipal pagou à empresa Meta Assessoria e Consultoria Contábil Ltda. a quantia de R$ 608.017,42 (seiscentos e oito mil dezessete reais e quarenta e dois centavos), referente aos contratos administrativos 75/2013 e 92/2013 (fls. 437/440 e 724/730). Desse montante, R$ 140.650,00 (cento e quarenta mil seiscentos e cinquenta reais) retornaram diretamente da conta bancária da empresa para as contas bancárias de titularidade dos ex-Secretários Municipais (fls. 724/730). Assim, ao que tudo indica, 23,13 (vinte e três vírgula treze por cento) do dinheiro público desviado teve por destino direto os bolsos particulares dos ex-Secretários Municipais.

50. Em análise de cognição sumária, e diante dos elementos informativos que acompanham a exordial, verifica-se que há indícios veementes de que as contratações foram pensadas como uma forma de viabilizar o desvio de dinheiro público, por meio de fraude aos certames, gerando enriquecimento ilícito de todos os envolvidos, causando sérios prejuízos ao erário, uma vez que fora notificado o desvio de mais de R$ 608.017,42 (seiscentos e oito mil dezessete reais e quarenta e dois centavos) dos cofres públicos. [...] (fls. 51/53)

As razões do afastamento do agravante do cargo estão postas na decisão.

[...] 79. No caso em apreço, tenho que o pleito liminar de afastamento do Prefeito Municipal de Araputanga/MT do exercício do cargo, deve ser acolhido em sede de tutela específica, como forma de garantir o bom andamento da instrução processual na apuração das irregularidades apontadas, uma vez que os elementos informativos que acompanham a exordial apontam indícios veementes de ativa participação dos agentes públicos, dentre estes o Prefeito Municipal de Araputanga, Sidney Pires Salomé, em fraude de licitação, e desvio de verbas públicas, em favorecimento pessoal a integrantes diretos do primeiro escalão do Governo, conforme já apontado e, especialmente, no item 49 do presente decisum.

80. Discorrido sobre os fatos nos quais repousa a pretensão externada na exordial, não se pode desconsiderar, como bem anotado pelo órgão ministerial, que a continuidade do prefeito no exercício do cargo poderá corromper e “acertar” documentos, forjar provas, intimidar servidores públicos subordinados, com o fito de esquivar-se de eventual responsabilidade.

81. Como bem assevera o nobre representante do Ministério Público, o contrato administrativo nº 75/2013, celebrado entre o Município de Araputanga e a empresa Meta Assessoria e Consultoria Contábil Ltda. ainda está em vigor, pelo que está o Prefeito Municipal de Araputanga autorizado a continuar repassando quantias de valor dos cofres públicos em favor dessa pessoa jurídica, que a toda evidência se presta como “fachada” para desvio de dinheiro público.

82. Da análise dos elementos investigativos, conclui-se que há fortes indícios de improbidade administrativa.

[...]

84. Em suma: consta dos autos indícios de que os demandados, em especial o Alcaide Municipal, Sr. Sidney Pires Salomé, no exercício de seu poder, em atenção ao pedido do Secretário Municipal de Finanças e Planejamento, Edonias Alves da Costa, deflagrou dois procedimentos licitatórios, um para serviços de consultoria contábil e administrativa e outro para implementar sistema de georeferenciamento na Prefeitura, tendo a empresa Meta Assessoria e Consultoria Contábil Ltda. vencido os dois certames, frise-se que meses antes do procedimento licitatório a aludida empresa tinha em seu quadro societário o mesmo Edonias Alves da Costa, atual Secretário de Finanças e presidente da Comissão Permanente de Licitação. Vale dizer, a seu pedido e a seu benefício o já mencionado Secretário de Finanças Edonias Alves da Costa deu início a procedimento licitatório e recebeu valores, locupletando-se ilicitamente de dinheiro público com inegável prejuízo ao erário.

85. Igualmente, vem o Prefeito Municipal respondendo outras tantas notificações extrajudiciais promovidas pelo Ministério Público Estadual, consoante documentos atrelados à inicial, e não só, também em apurações de outras fraudes em procedimentos licitatórios como bem menciona o Parquet e fazem prova as Portarias de instauração que instruem a inicial.

86. Assim sendo, levando-se em consideração o número de ações civis que o requerido vem respondendo, tanto de obrigações de fazer quanto de responsabilidade por atos ímprobos, com destaque as ações nº 1640-58.2011.811.0038 – Código nº 28206; 1420-21.2015.811.038 – Código nº 62739; 1627-59.2011.811.0038 – Código nº 28193; 1666-17.2015.811.0038 – Código nº 63385; 1652-33.2015.811.038 – Código 63343, que se referem respectivamente à adequação de prédio públicos ao acesso à portadores de necessidade especiais, fornecimento irregular e sem controle de qualidade de água aos munícipes; descarte irregular de resíduos sólidos “lixão a céu aberto”, sem atendimento a condições mínimas de controle de contaminação do solo, água e ar, e aos de improbidade administrativa por contratação de empresa de coleta de rejeitos sólidos sem licitação e/ou procedimento de dispensa; repasse de duodécimos à Câmara municipal local em percentual superior ao limite previsto no artigo 29-A, inciso I, da Constituição Federal, entre outros. Diante de tais acontecimentos, tenho que a permanência do Prefeito Sidney Pires Salomé à frente da gestão municipal dificultará o bom funcionamento do poder executivo, bem como dificultará a instrução processual, já que vem praticando atos e omitindo-se de outros que não condizem com o poder que lhe foi investido.

87. Somando-se a isso, embora indiciário, não se pode deixar de mencionar o depoimento do informante Gaspar Barbosa de Melo, que afirmou perante o Promotor de Justiça que presenciou e viu duas pessoas saindo da sede da prefeitura durante a madrugada levando uma pasta amarela. Transcrevo trechos do depoimento.

“... QUE o declarante informa que no mês de julho de 2015 realizou “bico” de vigia noturno do quarteirão da igreja católica; QUE o declarante informa que, precisamente no dia 26.07.2015, por volta das 03h30min, portanto durante a madrugada e o repouso noturno, presenciou e percebeu que duas mulheres entraram na sede da Prefeitura Municipal de Araputanga/MT, tendo um homem permanecido do lado fora; QUE o declarante estranhou, e muito, essa movimentação de pessoas durante a madrugada na sede da Prefeitura Municipal de Araputanga/MT; QUE o declarante passou a observar a movimentação dessas pessoas e percebeu que, depois de aproximadamente 15 minutos, as duas mulheres saíram do prédio da Prefeitura Municipal de Araputanga/MT na posse de uma pasta amarela; QUE o declarante informa que a sede da Prefeitura Municipal de Araputanga/MT está localizada na Rua Antenor Mamedes, região central dessa cidade; QUE o declarante procurou essa Promotoria de Justiça porque foi orientado por terceiras pessoas a registrar essa ocorrência perante o Promotor de Justiça...”

88. Aliado ao depoimento prestado perante a Promotoria de Justiça, somado o que preconiza o parágrafo único do art. 20 da Lei de Improbidade Administrativa, e em consonância com a jurisprudência, alternativa outra não resta que determinar o afastamento do Prefeito Municipal de Araputanga-MT, Sr. Sidney Pires Salomé, pelo período de 180 (cento e oitenta) dias, pois à frente do Poder Executivo Municipal poderá vir a influenciar testemunhas ou impedir acesso a documentos, como apontado no depoimento supra, e corroborado pelos documentos que instruem a exordial.

89. Consequentemente, leva-se a crer que se torna necessária a medida mais drástica para a apuração dos supostos crimes de improbidade, com maior rigor e celeridade possível.

90. Outrossim, em caso como nos autos, o interesse público em afastar o agente ímprobo deve estar acima do interesse particular do mandatário em permanecer no cargo, especialmente quando este utiliza-se do mandato para criar obstáculos ao devido processo legal e investigações do órgão ministerial.

91. Portanto, do exposto, restaram evidenciados fortíssimos indícios para se determinar o afastamento preventivo do requerido do exercício do cargo de Prefeito em virtude da prática, em tese, de atos de improbidade administrativa. [...] (fls. 60/62).

Portanto, está suficientemente demonstrado que o agravante busca, no exercício do cargo, impedir ou, no mínimo, dificultar a apuração de fatos gravíssimos, em detrimento do minguado erário. Denota-se a existência de potencial situação de tensão ou colisão na permanência no cargo daquele a quem o povo conferiu legítimo mandato e a urgência do seu afastamento, para recolhimento de provas inadiáveis da prática de atos ímprobos, cujos indícios veementes indicam e tisnam a confiança nele depositada. 

Aqui, fala mais alto o interesse público, visto que é preciso que as provas sejam colhidas com urgência, sob pena de esmaecerem. 

[...] É preciso falar cada vez mais de qualidade política para o nosso país. O que requer, de um lado, a eterna vigilância contra aqueles políticos que não perdem a oportunidade para fazer de sua caneta um pé de cabra e, de outro, valorizar os que tornam a política a mais essencial, a mais bonita, a mais realizadora de todas as vocações humanas: a vocação de servir todo o povo [...] (Discurso do Ministro Carlos Ayres Britto, por ocasião de sua posse no Superior Tribunal Eleitoral).

[...] Eu vou concluir, Senhor Presidente; não vou ler o meu voto, vou oralizar apenas essas palavras pelo adiantado da hora e pela desnecessidade também da argumentação tão bem feita pelos que me precederam.

Quero dizer que dói em cada um de nós, dói na alma, dói no coração ver um governador sair do Palácio para a cadeia. Isso acabrunha o país como um todo e constrange cada um de nós enquanto seres humanos. Mas o fato é que há quem chegue às maiores alturas só para fazer as maiores baixezas.

É preciso que o Estado reaja. Não quero aqui condenar ninguém, não é o momento, estamos apreciando um habeas corpus, mas muitas prisões de altas autoridades do País se fazem necessárias pelo seu caráter profilático, pelo seu caráter de exemplaridade; e, nesse ponto, eu não posso deixar de secundar o que disse a Ministra Cármem Lúcia [...]. (Trecho do voto do Ministro Carlos Ayres Britto: STF, Tribunal Pleno, HC 102732/DF, relator Ministro Marco Aurélio, DJe 6/5/2010).

Mutatis mutandis, é necessário pontuar que em uma República não se pode conceber que o Prefeito continue em pleno exercício do cargo, quando este é utilizado para impedir a apuração correta dos atos ímprobos que indícios apontam terem sido praticados.

No julgamento do Agravo Regimental na Suspensão de Liminar e de Sentença (AgRg na SLS 467/PR), de relatoria do Ministro Barros Monteiro, Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (Dj 10/12/2007, p. 253) assentou que: [...] de outro lado, bem asseverou o em. Ministro Edson Vidigal, ao apreciar hipótese assemelhada (SLS n.16-BA), que o afastamento temporário de Prefeito é medida prevista em lei, sendo “necessária apuração, com rigor e maior celeridade possível, das irregularidades imputadas ao requerente, pois o 'homem público', que administra o dinheiro público, tem a obrigação de se revelar probo e merecedor da comunidade que o elegeu” [...]. [sem negrito no original].

Como assinala Ruy Cirne Lima, a proteção dos bens e dinheiros públicos é estabelecida, em primeiro lugar, contra o próprio administrador público, nos termos da equação da relação de administração. É que a utilidade pública – a ser eficazmente criada, promovida, incentivada e preservada pela ação administrativa – é toda ela protegida pelo Direito. E o é, primacialmente, contra o administrador (Princípios de Direito Administrativo, 7ª ed., 2007, pp. 553-554).

Evidentemente, os desígnios no trato dos bens públicos não dependem do legislador ordinário. Há uma compreensão e uma interpretação constitucional alheias, superiores e prévias à colocação dos legisladores. A estes cabe viabilizar e assegurar a eficácia dos desígnios constitucionais, essencialmente protetores dos bens que quis reputar públicos. 

[...] os exercentes de funções políticas agem debaixo de um estatuto especial, viabilizado pelo mandato; esse estatuto foi qualificado por Cirne Lima como relação de administração. O administrador gere coisa alheia. O dono continua sendo o povo. É em seu nome que age o governante, que não pode se comportar como dono, mas como administrador, mandatário. Por isso, Sampaio Dória vê no mandato político espécie perfeita do gênero mandato.

É muito didática a síntese do saudoso mestre: “1º) o representante tem de querer com o povo, ou como o povo, e nunca em nome próprio, como em causa própria; 2º) as atribuições dos governantes são as instruções do povo em leis ou costumes, ou tudo o que estiver implícito na finalidade do encargo; 3º) com a eleição de governantes, o povo não aliena o direito de os chamar a contas, e responsabilizá-los pelo que tenham feito, ou deixado de fazer; 4º) o governante é autodeterminante na técnica com que desempenhe seu mandato” (ob., p. 312). (ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 83 e 96).

Sobre a medida de afastamento do cargo público no campo da improbidade administrativa, Émerson Garcia e Rogério Pacheco Alves assinalam:

[...] Por intermédio do afastamento provisório do agente, busca o legislador fornecer ao juiz um importantíssimo instrumento com vistas à busca da verdade real, garantindo a verossimilhança da instrução processual de modo a evitar que a dolosa atuação do agente, ameaçando testemunhas, destruindo documentos, dificultando a realização de perícias etc., deturpe ou dificulte a produção dos elementos necessários à formação do convencimento judicial. Busca-se, enfim, propiciar um clima de franco e irrestrito acesso ao material probatório, afastando possíveis óbices que a continuidade do agente no exercício do cargo, emprego, função ou mandato eletivo poderia proporcionar. 

[...]

Nesta linha, embora não possa o afastamento provisório arrimar-se em ‘meras conjecturas’, não tem sentido exigir a prova cabal, exauriente, de que o agente, mantido no exercício da função, acarretará prejuízo ao descobrimento da verdade. Indícios já serão suficientes à decretação da medida, o que em nada infirma o seu caráter excepcional. Como sinteticamente exposto por Galeno Lacerda, ‘se o dano ainda não ocorreu, não se requer prova exaustiva do risco. Basta a probabilidade séria e razoável, para justificar a medida’. Segundo pensamos, a análise judicial quanto à presença de ‘probabilidade séria e razoável’ de risco para a instrução processual passa, necessariamente, pelas denominadas ‘regras de experiência comum’ (‘máximas de experiência’) ‘subministradas pela observação do que ordinariamente acontece’ (art. 335 do CPC). Este, a nosso ver, o único caminho possível ao ingresso de presunções no campo de análise do ‘periculum in mora’ [...] (ALVES, Rogério Pacheco; GARCIA, Emerson. Improbidade administrativa. 6. ed. Rio de Janeiro, 2011. p. 899-901).

Esta Câmara tem-se posicionado:

[...] O artigo 20, parágrafo único, da Lei nº. 8.429, de 2 de junho de 1992, autoriza o afastamento cautelar do agente público, em ação civil pública por improbidade administrativa, quando presentes indícios veementes e concordantes da prática de atos ímprobos, bem como imprescindibilidade à instrução processual. [...] (TJ/MT, Quarta Câmara Cível, Agravo de Instrumento 35317/2015, relator Desembargador Luiz Carlos da Costa, julgamento em 4/8/2015).

[...] - É legitima a medida de afastamento da função pública, quando haja efetivamente riscos de que a permanência no cargo respectivo implique obstrução da instrução processual, a teor do disposto nos artigos 20 da Lei 8.429/92 e 37, § 4º, CF. (TJ/MT, Quarta Câmara Cível, Agravo de Instrumento 46201/2012, relator Doutor Sergio Valério - Juiz convocado, julgamento em 26/3/2013).

[...] Deve ser mantida decisão de primeiro grau que determinou o afastamento de servidor público do cargo que ocupa, quando existentes indícios suficientes de sua participação no desvio de recursos públicos, bem como da tentativa de obstar a comprovação dos ilícitos supostamente praticados.

Recurso não provido. (TJ/MT, Quarta Câmara Cível, Agravo de Instrumento 36112/2011, relator Desembargador Luiz Carlos da Costa, julgamento em 23/10/2012).

Em conclusão, o recurso se apresenta de manifesta não procedência, a autorizar decisão unipessoal do relator.

Quanto à petição de fls. 302/308, registro que a assistência deve ser requerida pelo terceiro interessado nos autos do processo em curso na Primeira Instância.

Essas, as razões por que, com fundamento no artigo 527, I, do Código de Processo Civil e no artigo 51, VII, primeira parte, do RITJ/MT, nego seguimento ao recurso de agravo de instrumento.

Por fim, indefiro o pedido de assistência formulado nesta instância e determino o desentranhamento da petição e documentos juntados às fls. 302/524.

Intimem.

Às providências.

Cuiabá, 9 de setembro de 2015.

Des. Luiz Carlos da Costa

Relator